E fumava o cigarro tranqüilamente, não pensava, sentia. Com se sente a dor de estar vivo, a vida partida ao meio; o reflexo no espelho, apesar de mudo, lhe fazia a mesma indagação: o que aconteceu? Talvez só o tempo que voltou, aos tempos de angústia discriminada e insensata. A grande alegria da manhã não lhe bastava, egoísta que era... talvez apenas desejasse novos horizontes... como o peregrino perdido no meio do deserto, talvez desejasse não desejar um rumo. A vida sem existência; não compreender é uma sorte, mais quem realmente compreende?
O espelho, apesar de inerte, também abriga a vida, e os outros através dele, conseguem descobrir o seu âmago, olhando ao fundo do seus olhos – os olhos do espelho, que mesmo mudos, falam em alto e bom som... mas é como se sussurrassem: acorde do sonho da vida. Naquele espectro de irrealidade que somente ele carrega, mais que ela, naquele momento, conseguia pressentir e sentia que poderia carregá-lo para o resto da vida. A mesma sensação, em horas obscuras: o que aconteceu?
Ou então, o que mudou? Que não poderia mais continuar, nem o mesmo caminho, nem ser a mesma pessoa, muito menos sentir as mesmas sensações com as mesmas pessoas. Só a sensação do cigarro lhe era familiar. Entretanto, nada familiar, porque nem a sua família lhe era familiar, menos o cachorro, tão íntimo do espelho, que descobria o âmago dela, através dele... sem que ela desconfiasse.
Perplexa de si, querendo esmagar-se, ou esmagar a angústia, a indagação, o vício pelo cigarro... o que aconteceu??
Muda de si.