segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Às vezes sinto as palavras como se fossem as únicas coisas das quais realmente disponho, mas desfrutá-las é tornar pesado a melhor parte. É um poder que acontece e deixa os sentimentos com gosto ocre e cheiro acinzentado, porque pintados de razão.

Por este juízo, é preciso entender os olhos, meus caros...

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Uma paixão ao primeiro som

(ou A serena revolta dos brasileiros ou Investidas na última flor do Lácio)


Aliet era ainda muito jovem quando se apaixonou pela primeira vez. Era uma adolescente holandesa a dominar o inglês e o neerlandês, tendo aulas de francês, já almejando ser uma grande linguista, "entendedora" das mais vastas literaturas mundiais.Sua primeira paixão, quase platônica assim, não foi por um lindo rapaz, nem por qualquer outra moça, nem seus professores, ou primos ou um lindo cantor ou jogador de futebol. Aliet se apaixonou pelo português. 
Em um café, certa tarde, um rapaz tímido, de olhos verdes e pele morena, recitou um poema desconhecido em uma língua desconhecida. Sem entender uma só palavra, Aliet chorou as lágrimas mais emocionadas de sua vida. O som das palavras ditas invadiam todo o seu corpo, fazendo-a estremecer, eram todas tão suaves, a pronúncia era tão límpida. O francês, nem muito menos o italiano eram o idioma dos apaixonados. Era aquela língua que chegou desconhecida, sem se apresentar, com toda a sua força, beleza e ternura. 
Sem poder conter-se, foi atrás do jovem trovador, perguntar-lhe que língua era aquela, que parecia ser o idioma dos deuses e descobrindo o português logo tratou de transferir seu amor ao jovem, que se chamava João: 
- Portuguese is the language spoken in Portugual, is not it?
- Yes, but the Portuguese is also spoken in Brazil and some African countries - teve como resposta. 
Pensativa, tomou conhecimento nesta tarde, também, da sua ignorância, com este idioma era um novo mundo que se abria a sua frente e ela ansiava ardentemente saber mais sobre ele. 
João, então, era um brasileiro residente em Portugal, aquele que lhe contou sobre os poetas dos dois países, sobre as culturas, a história e a gastronomia. Aliet não queria mais saber do "je sui Aliet", mas sim desse idioma que inventou a saudade e não pensou duas vezes em trocar as aulas de francês para português.
Sofreu com o relutância dos pais, sofreu com esta última flor do Lácio, complicada e traiçoeira. 
E o tempo passou, João foi embora com a primeira desilusão amorosa, mas a paixão só crescia, e ela desejava visitar Portugal, Brasil, Moçambique, Cabo Verde, Timor Leste, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe e, sem esquecer, a Angola. E eram tantos países para visitar, tantas culturas diferentes. Tantas novas paixões. 
Com Portugal, reconheceu seu poeta favorito: Fernando Pessoa e jurou poder comer pastéis de belém com o vinho do porto todos os dias. Com Moçambique se apaixonou por Mia Couto, seus poemas e contos fantásticos e com Cabo Verde ouviu Cesária Évora, se encontrou nas mornas e sentiu sodade. Tanto mais para se falar que aqui não cabe, mas seu encanto, a menina de seus olhos era o Brasil e seu samba e sua simpatia, o Brasil de Caetano, de Drummond, o Brasil dos olhos de ressaca de Capitu. 
Aos trinta e cinco anos Aliet, realmente, virou uma linguista - especializada em língua portuguesa -, não tinha visitado nem Timor Leste e nem tantos outros países e sem dúvida já falava muito bem o idioma, apesar de esquecer palavras como "cunhado" e "travesseiro". Ela escolheu o Brasil como sua casa. E essa escolha veio com o incomodo que sentia ao constatar que sua paixão tinha um defeito: os portugueses falavam como se suas amígdalas fossem gigantes! E em todos os oito países era assim, exceto o Brasil, aqui todos os cantos eram limpos, claros e excepcionais. Como se, silenciosamente negassem apenas essa herança da colonização, quase um novo idioma.
Ficou, amou o Rio, a Bahia e também o Rio Grande gaúcho, amava ainda mais ver suas filhas voltarem da escola e chamarem mamãe, ela não era mommy nem mama, era simplesmente mamãe. Mas o melhor, ah... o melhor, era dizer sua palavra favorita, palavra que só os brasileiros conheciam. Com ela sempre recebia suas filhas. É que na casa de Aliet tinha cafuné todo dia.

domingo, 7 de junho de 2015

Rotina

Acordar. Sentimento de morte. Folia. Pelos e lambidas. Reclamações e café. Estalos de um andador. Televisão. Ensurdecimento. Sair. Passos, juntos, atrás. O cheiro do mato. E o chacoalhar das folhas no vento. Sentimento do mundo. Barro. Crianças que se maravilham. A volta, cansaço. Água. Mais água. Música. Comer. Ler. Descobrir um novo mundo. Querer fazer parte. Grades invisíveis. Querer solitude, sentir solidão. Reclamação. Sentimento de culpa. Choro e raiva. Resistência, sem luta. Azul e amarelo: o céu. Os patos no céu. Estrelas no céu. O cheiro do mato. Uma horta. Cachorros. Risadas desconhecidas. Uma criança que vêm. Comer, beber. Doces. Mais doces. A noite o samba. Ter companhia. Querer mais presenças, sentir solidão. Telefone. Adeus. A volta. Energia sugada. Ler. Novo mundo, de novo. A cabeça não para. Imaginação: não vem. Ilusão: não vem. Lucidez. Maldita lucidez. Sono não vem: malditos sonhos. Benditos sonhos. Sentimento de morte.

Acordar. Sentimento de morte. Folia. Pelos e lambidas. Reclamações e café. Estalos de um andador. Televisão. Ensurdecimento. Arte. Comer. Água que cai: não é cachoeira, não é chuva. Música. Ler. Novo mundo, não tão novo. Solidão. Espera. Espera. Espera mais um pouco. Uma hora a vida sorri. Nunca sorriu, não um sorriso cheio. O Fora é realmente o Fora. Não há dobra, não há arte. Não há presença. Espaços cheios de mais, passos vazios de mais. Reclamação. Falar de si. Falar do outro. Reclamação!! Silêncio?? O importante debaixo do tapete. O tapete cada vez mais grosso. Sou um estrangeiro. Não falamos a mesma língua. Não falo língua nenhuma. Não ter língua. Não ter pátria. Não fazer parte. Pertencimento ao outro. Lucidez, maldita lucidez. Sentimento de morte. Comer. Fechado, fechado. Tudo errado. Rápido. Mais rápido. Mais rápido, velocidade da luz. Distante, a cabeça não para. Distante, Longínquo. Sonhos. Aonde? Sentimento do mundo.

Acordar. Sentimento de morte. Acordar pra quê? Folia. Pelos e lambidas. Reclamações e café. Estalos de um andador. Televisão. Ensurdecimento. Reclamação. Reclamação. Falar do outro. Querer solitude. Ler, ler mais. Música. Dormir. Masturbação, quem sabe. Sem privacidade. Com privação. Grades que não se veem. Tornar o visível oculto. Enunciados. O que é liberdade. O amor é liberdade. É escolher as escolhas. Essa não é uma escolha. O sentimento não é uma escolha. A morte não é uma escolha. (Tem certeza?). A vida não é uma escolha. Água que cai. Banho. Força. Sou forte. Músculos. Meus músculos. Meus pelos. Meu corpo. Sua-minha vida. Minha vida!!!! Contra-ataque. Força. Pára. Não dá. Culpa, mais culpa. Choro. Sentimento de morte. Cicatrizes na pele, esperando por mais. Espera. Espera. Nada muda. Música. Alegria. Sentimento...

domingo, 24 de maio de 2015

O ainda não e o não mais

No café, dois amigos conversavam. Aparentemente a respeito da deterioração de uma relação:
- Você não gosta de mudanças, não é?
- Não é isto, gosto de mudanças, o que não significa que não possa sofrer com elas. O que não suporto é esse interstício entre o velho e o novo. Essa sensação de vida suspensa, onde nada realmente acontece. O mundo parado e minha cabeça girando em velocidade ímpar. Os pensamentos não fluem, o novo não é cristalino. Não suporto a vida des-estentida e ...o passo amargo do caos. Não sou uma pessoa cômoda, sou uma pessoa de planos.
- Mas a vida é caos, meu caro.
- O problema não é o caos. É essa dobra do tempo. É essa situação, essa sensação de quando a calmaria já não existe e o caos ainda não se instalou.
- Então, se puder, antecipe o caos.
(Sorrisos...)
(23 de maio de 2015)
____________________________________

Dedilhando imagens

Sinto saudade. Saudade das cortinas fechadas e das luzes, onde tudo era sépia, onde seu corpo se movia em um jogo de luz e sombra, escondendo-se e, em cada cena, a plenitude de suas feições. Saudade do seu espelho quebrado, onde sua imagem refletida paralisava-se em minha memória. Nele, o seu cabelo enrolado caía pelas costas e modelava sua cintura, enquanto seu sorriso inclinava-se para a direita. Nele, seus olhos refletiam-se, infinitamente e era a, sua pela, macia.
Um espelho que fascinava-me por mostrar sua silhueta em ângulos novos e como o rosa de sua pela era alaranjado, quando a luz refletia em seus mamilos e as dobras novas que se formavam nas mais diversas posições e como seu quadril transfigurava-se em mil tamanhos, ao bel prazer.
Invejo-o, pois ele desconhece censura e nele, o cheio docemente amargo de sua pela está impregnado. Só ele sabe como põe as meias, sentada na cadeira, como odeias o sutiã e só ele sabe como você movimenta-se na pura ausência de companhia.
É ele que conhece o seu rubor e as suas lágrimas, e o tom de sua voz quando cantas, sensores que meus olhos nunca captaram. É só ele tem o dom de vê-las pelos próprios olhos.
Quem me dera um dia quebrar este espelho e apagar todas as luzes. Nunca mais suas nuances seriam paralisadas e o espectro de cores da sua pele jamais seria percebido. Amaldiçoaria-a ao desconhecimento de si.

Mas a este papel renego. Mil vezes renego. Já que mesmo depois da morte, seu reflexo nele, jamais se apagaria. Em uma existência infinita, a memória do seu perfil, e dos seus gestos seria preservada. Só a natureza pode dar-te o esquecimento. Já eu, busco o reflexo de ti, em cada parte do meu ser, sem esquecer e sem, contudo, poder lembrar.

(20 de maio de 2015)

sábado, 31 de janeiro de 2015

Produtos de uma beleza cega

Era uma festa, e eu, o penetra - conhecia apenas o amigo do aniversariante. Quem está pensando que eu invadi mesmo, esperem um pouco, fui escolhido a dedo por este amigo, para acompanha-lo. Acho que era um aniversário, ou uma formatura. Qualquer festa grande e razoavelmente chique.

Almejava apenas bebedeira, diversão e quem sabe uma mulher para passar a noite, era jovem então. E você sabe como são os jovens, cheios de ilusão e erros à cometer, um grande sentimento de vida e nada de morte. Nessa época, fugimos disso, sem imaginar o quanto vida e morte são a mesma coisa.

E assim, sucedeu-se, ao principiar daquela festa. Todos bonitos, bem vestidos, belos produtos a se exibirem naquela grande vitrine, com sorrisos, gargalhadas, toques e conversas sutis cheias de significado oculto. Eu naquele meio, sem conhecer ninguém, pensei que pudera ser quem quisesse, um advogado, um banqueiro, um cirurgião plástico milionário. Veja que pensava, eu, pobre rapaz, estudante de literatura, queria ser todos menos eu, em um mundo cheio de possibilidades e dinheiro.

Bebi.

Bebi cerveja da mais cara, uísque do bom, até dividi uma doce champanhe - da verdadeira - com uma linda morena, com seus olhos verdes, nitidamente falsos, mas nem por isso menos encantadores. Ela era inteligente, para a surpresa do meu preconceito idiota. Sacou logo minhas referências literárias no linguajar recém adotado para impressioná-la.

Não tardou que botasse nota nas minhas falsas palavras, tanto quanto aqueles olhos. Eu, eu... pobre de mim, que era o herói, que era o rei, humilhado fui na frente de um grande círculo, aquela pequena traiçoeira pegou minha carteira, e em alto disse meu nome: Walter Pinto (Walter em homenagem ao Disney, Pinto do pai, morto e enterrado no pobre sertão). Eu sempre tive do orgulho do meu nome, mas fiquei atônito, perplexo, aquele era eu então? digno de riso? de escárnio?

Tinha flertado com talvez, umas cinco mulheres, da quinta me afastei, triste pela cena, triste por ter bebido tanto. Sentei num canto e reparei que naquela festa também haviam crianças, e senhores de idade. Enquanto de um lado crianças brincavam, do outro, o velho fazendeiro falava de sexo com a amante. E pode acreditar, era a pequena morena dos falsos olhos.

Nesse ponto, me senti livre por não ter participado daquela vida, mesmo que por uma noite. Então meus olhos se encontraram com os de uma menina cega. Foi encontro, sei não, só sei que ela parecia me ver e sentir da minha tristeza. Estávamos tão próximos que pude escutar  da conversa. Ela tinha conhecido uma jovem da minha idade, que em voz doce exclamara o quanto a pequenina era bonita. Em resposta, teve somente o sussurro "foi minha mãe quem mandou dizer?" E a moça sorriu desconcertada.

Passado metade de ora, a moça ao reparar que a menina ficava sentada, chamou-a para cadeiras mais próximas a minha. Perguntando 'que diabos' - e esse começo foi pensamento meu - por que ela achou que a mãe havia pedido a uma estranha para elogiar a filha. E um novo sussurro feito flecha ouvi "porque eu sou cega, não posso dizer se sou bonita". A moça, com tanta sensibilidade respondeu que não era preciso olhos para se ver bonita, que a visão não era tão importante, não tanto quanto o tato, que recobre todo o nosso corpo, e começou:

"Me dê suas mãos, agora as ponha no seu cabelo, ele é liso e loiro como se fosse raios de sol. Você pode sentir os fios finos, macios e lisos, não pode? Um cabelo assim só pode ser lindo... pegue agora no meu e veja como é ressecado... qual cabelo você acha mais lindo?"

A menina ficou contrariada, mas acabou por concordar que talvez o seu cabelo fosse o mais bonito. E assim a moça prosseguiu, pedindo para a pequenina botar as mãos em volta do rosto, na boca bem delineada de criança, no seu nariz pequeno e arrebitado, " o desejo de toda mulher".  Ela foi narrando as características físicas da menina e fazia ela concordar toda vez que sentia que a moça descrevia algo certo.
Por fim, a criança deu um sorriso leve "é, talvez eu seja bonita mesmo..."

A moça completou, "nunca esqueça que você é linda, e também, nunca deixe ninguém lhe dizer o oposto, menina". A doce criança começou a chorar de levinho e finalmente desabou no colo de uma desconhecida "minha mãe sempre me diz que eu sou bonita, mas todo mundo também diz, 'coitadinha dela, cega...', como se eu fosse um monstro digno de pena..."

Eu, bêbado e humilhado, também chorei... com tamanha doçura e delicadeza.

Fui embora com certeza, eu era escritor, Walter Pinto, e iria exibir isso ao mundo, com a sensação de que não sou um produto.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Um conto para velhas crianças

Estava uma vez, no ônibus, era uma das muitas viagens que fazia à trabalho, e foram tantas que nem me lembro o destino desta e reparei em um doce menininho, de uns 5 anos. Um menino muito, muito doce.  Era uma criança quieta, que não importunava a mãe com perguntas sobre quanto tempo a viagem iria demorar, não gritava e não perturbava os outros passageiros...
O menino logo ganhou a minha atenção, porque olhando a janela, daquele início de manhã disse à mãe, suavemente:
- Olha mãe, a lua, ela tá caindo, a Lua vai cair mãe, ela tá caindo, ela tá caindo, caindo...
Aquela observação foi tão divertida e bela que um senhor, com seus, talvez, 80 anos, já de cabelos brancos, olhos profundos por trás do óculos, e de uma elegância impecável se virou para o menino e falou:
- É, a Lua todo dia sobe no céu, e depois vai caindo e caindo. E o Sol também faz isso sabia?
O menino, cheio de curiosidade, tirou os olhos da janela e se virou para o seu interlocutor à espera de mais informações sobre aquele estranho fenômeno dos astros que acabara que descobrir.
- E porquê eles fazem isso??
- Ah, isso é uma estória longa, lá de quando o Universo foi criado e a Lua e o Sol eram jovens.
E os olhos do menino cresciam ao analisar as palavras do velho.
- O Sol e a Lua, logo que se conheceram se apaixonaram perdidamente, mas era um amor impossível, por conta de suas tarefas irremediáveis. É que o Sol, teve o destino de iluminar uma galáxia inteira, dado o tamanho de sua luz, já à Lua, mais discreta e com uma luz mais suave, o de iluminar as noites para mostrar o caminho aos viajantes. Com os seus trabalhos eram muitos distintos, eles não poderiam ficar juntos e nunca mais se veriam.
Então eles buscaram todos os sábios do universo em formação, queixando-se de seus trabalhos e procurando uma solução. Contudo, ninguém pôde ajudar-lhes já que suas tarefas foram recebidas de acordo com a natureza de cada um, a busca só fez tornar conhecido a esse Universo o conceito de amor impossível,
Até que em um momento, a Terra, que deveria escolher suas luas e um astro para iluminar-lhe, comoveu-se com o desespero dos amantes. Sabe menino, a Terra era um ser adorável, rico em bondade, desistiu do propósito de possuir várias luas, escolhendo apenas aquela Lua, também desistiu de ser o primeiro planeta a receber a luz de um astro em determinada galáxia. Assim, conversou com outros planetas, para que pudesse ser o terceiro planeta a ser iluminado pelo Sol, também convenceu Mercúrio e Vênus de escolherem o Sol como seu astro, é claro.
- Mas isso não é uma solução, o menino brandou calmamente, o trabalho deles continua a ser irremediável, como você falou.
- Sim, a Lua e  o Sol fizerem essa mesma indagação à Terra, mas o que ela tinha em mente não era mudar o destino dos dois amantes, mas apenas achar uma saída. Essa saída já era conhecida, e então, ela explicou: "Eu, como planeta, devo rodar em torno do Sol, e em torno de mim mesma, o que faz, do meu ponto de vista, que o Sol suba aos céus todas as manhãs e desça a cada noite que se inicia. A Lua, como gira ao meu redor, só estará no céu às noites, em momentos muito diferentes do Sol, ela escalará os céus ao cair da noite e deverá cair aos poucos assim que se inicia o dia, Já que as coisas funcionaram assim, vocês podem perceber que no início das manhãs e no findar das mesmas, vocês dois estarão nos céus, ao mesmo tempo e então poderão se encontrar todos os dias, por pouco tempo, mas é só assim que poderá acontecer..."
O Sol e a Lua ficaram maravilhados, a solução finalmente foi encontrada e logo eles começaram seus trabalhos, pois a Via Láctea, a galáxia deles, já estava praticamente formada.
E desde então, cada um sobe aos céus, nos seus devidos momentos e por segundos se encontram, para se amarem e matarem a saudade que sentem um do outro!!
- Que legal!! Mãe, isso é verdade?? Mas e o eclipse?
A mãe, que estava adorando a estória do velho, apenas acenou que sim com a cabeça e deixou o velho responder.
- Ora, o eclipse é um dos raros momentos concedidos pelo criador do Universo aos amantes, para que passem mais tempo juntos!!
- Ao fim da estória a viagem também terminou, nunca mais vi nenhum daqueles passageiros, o velho e a criança também não se viram mais, já que aquele elegante senhor contador de estórias logo morreu de velhice. O que é uma pena, já que aquele menino, mesmo depois de anos, continuou a olhar os céus, todos os dias - ao amanhecer e entardecer - pensando na felicidade da Lua e do Sol ao se encontrarem, mesmo sabendo ser essa apenas uma doce estória.

domingo, 23 de novembro de 2014

Fui a Curitiba e senti as quatro estações de Vivaldi, vi chaves nas calçadas do centro, passei por uma cigana misteriosa jurando um futuro bom na palma de minha mão, e até mesmo, no alto de um prédio, vi  uma estátua de águia, com duas cabeças, 
Mas fiquei triste, é que passei por um ônibus que todos os dias vai à Solitude. 

sábado, 8 de novembro de 2014

"Ode" ao fim de um ciclo

 Momento de quando as clareiras de um riso luminoso, de um devir cheio de ânsias e sofrências, impetuoso por sentir ao intermédio da eternidade, o magnetismo dos gestos, a suavidade do olhar e calmaria de todas as presenças e ausências se esvanece, na sombra da dúvida.
Ah Tempo, suas águas sempre foram inflamáveis, mas da dor, a agudez só resta a lembrança, porque minhas convicções são a soma das piadas mal contadas pelo palhado que, desesperado, já não sabe mais sorrir. Resisti o quanto pude, mas as feridas que o senhor reinou em pungir-me, agora cicatrizam em dura pele, na qual os gestos magnéticos não alcançam mais a seiva. Resisti, mas o olhar agora é mais dissimulado que Capitu – que jaz onde a inocência teima. Resisti, mas viajar entre extremos, subir aos céus e dar a cara na terra e mergulhar cego no breu do inferno, fez da clareira luminosa um sorriso de fogo.
Ah Tempo, será que de tanto inflamar-me o rio de sangue que corre em mim, serás capaz de restituir a credulidade perdida, sem que se faça apoiar na transcendência de uma fé inconteste e tão perigosa quanto o ceticismo cruel e patético? Apesar do amargor que não vejo escorrer, recuso igualar-me àquele que de tanto sentir o sangue arrebatado teve o coração tornado veredas e as palavras ornadas de ódio. Com um devir mais ferino que político, vago entre tantos outros que resistiram, igualmente, e caíram na armadilha do viver automático, à contrariar o Livro dos Contrários, a ordem é a mentira sob a qual o caos se esconde.
Ah Tempo, me conceda finalmente esta primeira dança, porque necessito da música ensandecida e da frieza aguda, porque, finalmente, se a honra me concederes, findo estará o prólogo de minha vida.