segunda-feira, 1 de julho de 2013

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Quando uma simples notícia é capaz de dar fluidez a toda uma correnteza que jazia em duvidosa paz. Despertar de um sono apático para o renascimento doloroso do coração. Ainda frágil. Florescem ideias e sentimentos que os olhos tornam palavras, e as mãos lágrimas.
Não é um rio, é um mar inteiro, silencioso. 
Foi este o resultado da volta da minha memória.


Agora eu sei, nosso cordão umbilical nunca será cortado...

sexta-feira, 31 de maio de 2013

A Verdade do Homem


'A vida adora me dar chutes no estomago', pensou, quando sentado em frente ao espelho.


Mas não seria ele quem cria essa realidade assim como o espelho cria a sua imagem? Imagem dotada de verossimilhança, à medida que o próprio homem a ser refletido se reconhece. Não é a realidade.
É um mundo completamente igual, aos olhos do expectador, mas reserva a sua diferença à medida que a imagem não emite sons e transparece emoções mudas, sem perspectiva, tal qual um fantoche.
'Somos nossas próprias marionetes!', disse em voz alta, depois de minutos de introspecção. E o homem a sua frente apenas mexeu os lábios.
Suas rugas seriam exatamente as rugas que ele vê, seus olhos realmente seriam caídos, dando a noção de cansaço que sempre encontrou em si? Só se reconhece a medida que o espelho reflete as características que ele julga possuir, e que outros, assim também o fazem.
'Aparência, outros nos julgam segundo o que podem entender de nós, e assim, também nos julgamos'. É como se a vida inteira fosse falsa. Como se todos nós fossemos uma falsidade inócua. É que existem paralelos: a vida que julgamos viver, de acordo com nossas aparência de mundo e si, e do outro lado, a vida. Vida real? A partir desta ideia, pressupõe-se que vários mundos existem, e a cada segundo o homem cria mais um, quando marioneteia-se diante de outros olhos e dos próprios.


Cansou da auto-contemplação, quebrou o espelho e resolveu, de imediato, pregar a falsidade do universo, como único dogma verdadeiro.


domingo, 19 de maio de 2013

A vida é assim, ambígua, mas genérica.
Na hora do parto, quem dá á luz é a parteira, enquanto a parturiente ainda sofre as dores e, impaciente espera pelo rompimento da bolsa.
"Rompa-se.
Para que de um estrondo choroso nova vida se faça."

segunda-feira, 29 de abril de 2013

 – Sabem o que eu queria para hoje? 
A leveza dos filmes de amor estampada nos rostos de todo mundo!

quarta-feira, 27 de março de 2013

Caminho livremente pelas ruas. O sol de outono insiste em ser verão e queima. Há tanta claridade e eu gosto, procuro ouvir o som do mundo. Carros, buzinas, vendedores ambulantes, pássaros, musica sertaneja.
E eu passo por vários corpos e não há toque, apenas movimento, este que parece incansável e tão permeado de sincronismo. E eu não vejo os rostos... porque todos olham para baixo? 
E o pobre diabo aqui, com o nariz empinado, 'mó' arrogante. 
Parece medo de encarar a vida de frente.
Parece cansaço de encarar a vida de frente. 
Parece que eu é que sou ingênuo e vejo beleza em qualquer lugar.


(21 de março de 2013)

quinta-feira, 21 de março de 2013

Ser, o social.

O homem é um zoon politikon, é social, mas é animal; linha tênue que, às vezes, para não dizer sempre, é difícil de distinguir - na roda, quando todos estão, alto, a falar, o animal parece calar-se, observa, não sabe reagir. É que a natureza não tem palavra. À sós, cria um mundo inteiro: ideias, politicas, razões e números... 

Ou será o oposto?

E de quê serve tudo isto, para no fim, desaparecer, com a morte? 

Mas a arte é eterna, já dizem. Muito mais que a economia, a política, o capital ou o social, valor de uso, valor de troca. Valor. Na arte nos encontramos, sujos, sedentos, lascivos e belos. O outro não é só um alvo, um interesse, um número, é nós. Na arte, somos todos e apenas homens. Mas o que é o homem?

Mas o que é tudo isso? O que são todos esses signos?

terça-feira, 19 de março de 2013

Nessa rima eu asso

Fracasso, a sensação que me prenda à laço nesse espaço. Até parece que estou no hiperespaço, ou então perdido num Paço. E eu, que só queria me afogar no seu melaço, te dar um amasso, estou viciado no seu cigarro, no seu maço. É que na verdade meu coração transborda, não está escasso. Não sou nem devasso, apenas trespasso por um erro crasso!

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Brasileiros: ninguém sabe quem eles são

Às sete da manhã, ele acorda, todos os dias. Sem banho, bota a calça jeans, os sapatos, a melhor camisa - passada e  engomada, sempre branca, bege, rosa claro... Come porque é obrigado a comer e saí às ruas. Está vestido com sua armadura: ombros erguidos em uma postura fechada e face casmurra. Desfila a sua magreza, a sua pele negra e o seu "cabelo ruim", todos os dias.  
Todos os dias ele saí de casa, no bairro distante,  sem ônibus que queira pegar. Ele anda; anda do bairro  ao centro, do centro ao outro bairro, trajeto que dura quase a manhã inteira. 
Ninguém sabe se ele almoça. 
No final da tarde, do outro bairro ao centro, do centro ao seu bairro e à sua casa ele retorna. Vestido com sua armadura. 
Ele é velho, apesar dos fartos cabelos marrons em seu médio "black power" (nem sequer um branco), não usa aliança, mas tem perfume de mulher nas roupas e poderia ser avô. Ninguém sabe quem ele é, ninguém sabe se realmente tem mulher ou filhos, mas todos sabem que ele é negro, velho. Parece indigente, mas não é, pelas roupas limpas que sempre veste - principalmente a camisa passada e engomada, sempre branca, bege, rosa claro...
Todos os dias, ele anda, todos os dias ele passa por vários rostos, casmurros como o dele, suaves, infantis, cansados, melancólicos... Mas estes rostos não o vêem. Ele é uma sombra, uma armadura que quando detectada causa medo e repulsa.
Ele é João, brasileiro.
Às oito da manhã ela acorda, porque a acordam, todos os dias. Toma banho, obrigada. Veste as roupas, sempre saia média, meia-calça cor de pele, sapato baixo, "tipo freira". Seus cabelos já bem grisalhos e nunca pintados são feitos em coque. Sua expressão é cansada. 
Não sei se come. 
Todos os dias, ao sair de casa, ela pega guarda-chuva e ônibus, sempre o que quer pegar e não o que deveria. Vai ao mercado, anda, anda e anda, pega as verduras e sai. Pega outro ônibus, este sempre é o que deve. Ela vai ao calçadão da cidade, por vezes, come algo por lá. 
Sua expressão é cansada mas a voz é potente. Anda do inicio ao final do calçadão, esbravejando em favor da moral e dos bons costumes. A menina de saia e decote que se cuide, para não virar motivo para o seu sermão.
Do final ao início  do calçadão ela esbraveja em favor da moral e dos bons costumes, de Deus e do que mais lhe vem na cabeça.
Muitos passam por lá mas estes ouvidos não a ouvem. Os olhos ligeiros, reparam a sua expressão exaltada, causando medo e repulsa. Os mais jovens fogem velozes, principalmente quando interpelados. 
Ninguém sabe porque ele fala essas coisas, a tarde inteira, todos os dias. Mas todos sabem que ela é parda, velha e não fala nada com nada. Desfila pelo calçadão as suas sentenças, desfila o cabelo grisalho, a saia média, a meia-calça cor de pele e o sapato baixo "tipo freira". Seus cabelos feitos em coque quase desmancham. Tem cara de viúva que perdeu também os filhos. Mas alguém cuida dela, porque as roupas são limpas. 
Todos os dias, no final da tarde, ela pega o ônibus, desta vez sempre o mesmo, e chega em casa. 
A sua expressão é cansada. 
Ela é Maria, brasileira.
Às vezes quando João passa pelo calçadão, Maria já está lá. Ela não o vê, e ele não a escuta. E todos os dias, ninguém se pergunta quem eles são, nem porque João é casmurro e Maria cansada.