sábado, 31 de dezembro de 2011

Reveillon no submundo (?)

Só deu-se conta quando já estava na rua, com os fogos explodindo em seus olhos e ouvidos, apressadamente, antes da meia-noite. Nestor havia lhe roubado todo o seu miserável dinheiro, e a reivindicação lhe rendeu uma boa surra. Ingratidão. Enquanto ela lhe deixava rico ele aproveitou para roubar-lhe o soldi e a alma, bulindo seus seios com força. "Italiano cretino" - era o que pensava.
O fato era que sangrava, com a maquilagem borrada e os olhos roxos. Sua lingerie nova, toda rendada, agora encontrava-se rasgada, suas cicatrizes nas costas, de outras brigas, pareciam brilhar no mesmo ritmo que os fogos. Até mesmo os saltos altos, platinados, não foram poupados pela ira; agora possuíam cor de carne, por causa do barro na rua, e estavam quebrados, fazendo com que a pobre Eufrásia - mais conhecia como Dercy, mancasse sem harmonia. Era humilhante. Pois, mesmo prostituta, teimava em possuir sua dignidade de mulher. Absurda, um quadro desbotado.
Seguindo pela calçada não lhe faltavam buzinadas, olhares, reclamações e elogios. Mas o que desejava era que um ser humano se indignasse a encarar seus olhos verdes e ser gentil - e que de preferência fosse homem (ainda conseguia ser vaidosa). Apenas palavrões e perguntas de quanto a "delícia" cobra pelo serviço.
A lembrança mais forte naquela noite seria para ela, então , a iminência de uma nova surra, pois ao aniquilar-se na esquina da Rua XV não obedeceu aos chamados dos homens que ali se encontravam. Sua sorte foi o quase estagnado chute no saco de um, saindo correndo e caindo mais a frente, sem que os dois quisessem segui-la.
O único homem a ser-lhe gentil mesmo, naquela última noite, foi enfim, o cachorro da vizinhança, mais conhecido como Baleia, que abanou seu rabo com tamanha felicidade que o olho que restou lembrava o velho diamante que Dercy herdou da avó e agora encontrava a posse, também, de Nestor, fazendo a chorar e encolher no canto da rua, imunda. Ao menos o cão gostava de sua presença, uma vez que deitou-se a ela, e não saiu do seu lado, mesmo com o estrondoso "Feliz Ano Novo" que se brigava com os fogos de artifício.

Ao amanhecer seus braços, pernas e rosto doíam, e Baleia lambia-lhe as coxas de maneira esquisita. Só conseguiu pensar "os homens são todos iguais, mesmo os cães..." - só querem bulir com ela."

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Nota apertada

Estreiteza: mil frases nas pontas dos dedos, mil palavras à esperar pronúncia.
O que consigo é silêncio.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

E a angústia... o verdadeiro alimento da alma

E fumava o cigarro tranqüilamente, não pensava, sentia. Com se sente a dor de estar vivo, a vida partida ao meio; o reflexo no espelho, apesar de mudo, lhe fazia a mesma indagação: o que aconteceu? Talvez só o tempo que voltou, aos tempos de angústia discriminada e insensata. A grande alegria da manhã não lhe bastava, egoísta que era... talvez apenas desejasse novos horizontes... como o peregrino perdido no meio do deserto, talvez desejasse não desejar um rumo. A vida sem existência; não compreender é uma sorte, mais quem realmente compreende?
O espelho, apesar de inerte, também abriga a vida, e os outros através dele, conseguem descobrir o seu âmago, olhando ao fundo do seus olhos – os olhos do espelho, que mesmo mudos, falam em alto e bom som... mas é como se sussurrassem: acorde do sonho da vida. Naquele espectro de irrealidade que somente ele carrega, mais que ela, naquele momento, conseguia pressentir e sentia que poderia carregá-lo para o resto da vida. A mesma sensação, em horas obscuras: o que aconteceu?

Ou então, o que mudou? Que não poderia mais continuar, nem o mesmo caminho, nem ser a mesma pessoa, muito menos sentir as mesmas sensações com as mesmas pessoas. Só a sensação do cigarro lhe era familiar. Entretanto, nada familiar, porque nem a sua família lhe era familiar, menos o cachorro, tão íntimo do espelho, que descobria o âmago dela, através dele... sem que ela desconfiasse.
Perplexa de si, querendo esmagar-se, ou esmagar a angústia, a indagação, o vício pelo cigarro... o que aconteceu??

Muda de si.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Sai desse sufoco rapaz...
Até parece que tem o corpo oco, fazendo de si uma cidade.
Como que de valente fez da própria trajetória uma história,
Sem se importar se havia afinal alguma vitória.
Porque nem a existência possui finalidade!

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Coração capital

No cais o cálculo da cabana.
(Cigana!!)
O corpo com carícia,
(Malícia...)
cabelos, curvas... à cabeça, a cachaça.
(que logo rechaça,)
Como se cordialmente conceituasse: contorno.
(pensando retorno,)
Compondo o canto, ao capítulo do conto.
(PONTO!)
Como se a calamidade caiasse a calmaria, culminando cà no calabouço.
(Por isso eu ouço...)
Coração.
(Pede perdão)
Caótico. Caos, confusão.
(logo de antemão!!!!)

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Nota Triste n. 2

O que requer mais coragem: viver ou morrer?
Porque não só desejar a morte, aos 10 anos de idade, mas recorrer efetivamente à ela não é normal.

ps: porém, me recordo, dentre meus 6-8 anos, em certos momentos já desejava a morte.

Nota Triste n. 1

O cotidiano comprime: nos enchemos de direitos e nem sequer conseguimos vivênciá-los plenamente.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Mediocridade e Não precisa fazer sentido!

E a vida sem arte é como arte sem vida. Parece não possuir cor, e um arrombo assola a alma, espaço que não consegue ser preenchido... nem dinheiro, nem sexo, e nem gula. É como o pintor que se acomete de Parkinson, bloqueio gigantíssimo que trava a sensação de tempo, como se o disco rodasse, mais o som não sai da vitrola... e não basta trocar o disco. Dá-se um paradigma ao próprio paradigma, bobagem metafísica, nada consola o coração, e quando isso ocorre, que vá pro espaço a razão iluminista

Como partir para a paralaxe? Mudar-se a posição não se mostra fácil, e o até o infinito sem arte é um erro... mesmo na infinita paralaxe a arte é a arte, é o que o meu coração me diz, e ele prefere música e amor até a madrugada.

domingo, 18 de setembro de 2011

Parece que a precipitação sempre lhe ocorre. E o precipitar é sempre inoportuno. Coincidências do acaso, mas sempre quando precisou gritar, sair correndo ou enfrentar a fera, a precipitação era pra seu precipício interior, o que no mundo, o reflexo acaba sendo o seu silêncio. E em horas assim calar-se acaba sendo tão inoportuno quanto a precipitação.
E, por fim, quis grudar-se à terra, como se fosse só raiz, e desaparecer como qualquer poeira. Mas ao acreditar que toda matéria é vida, percebe-se que a poeira também se acomete do sofrimento, e mesmo que desapareça, para ela, sempre estará em algum lugar.

17 de julho de 2011

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Recorte...

E o coração calmo, despalpitante. Estado de serenidade profunda, combinada com o vento, que neste instante quase inexiste, uma surpresa para cidade, no qual o vento é forte. Os cabelos soltos, não balançam e os gestos apenas fluem com o ritmo das águas gélidas do rio.
Auto-instrução nas profundezas, transparência escura no corpo nu. A pele sempre branca e estremecida, ao alcance de uma pedra, pára. Um homem a viu. Qualquer um desconfiaria das roupas surradas, do cabelo emaranhado e da voz vil; mesmo assim, até o vento insiste em não se alarmar, em não gritar, pedir socorro.
Os pés do homem agitam as águas, ele nem tira as próprias roupas, como se molhá-las fosse o menos insignificante em uma situação, para outros olhos, instigante. Martírio do homem ao lutar contra ás águas e não chegar ao alcance da moça. Poderia estar mais quente, a vida menos turva aos seus olhos, sua boca menos seca e seu corpo mais úmido.
Finalmente, após longa luta, segura seu braço, impede o fluxo, e o coração? Continua calmo. Trazê-la para a terra, aos cuidados de não sujar-lhe o corpo. Finalmente um grito cortante, o susto, juntamente: o esmalte vermelho e o rosto juvenil:
- Socorro!!!
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Manchete: morador de rua encontra corpo de jovem desaparecida a três meses.
A jovem, de 15 anos, desapareceu em março, quando ia para a escola, tudo indica que seu ex-namorado, de 18 anos a seqüestrou. Segundo os policias o corpo apresentava sinais de violência sexual e foi jogado no Rio Itabiruno horas antes de o morador de rua, o senhor Ignaldo, encontrá-lo.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Reflexões baratas de uma manhã de quinta!

Talvez o homem tenha tomado pra si o "pra sempre", e como resultado, dominado tanto o Planeta, com suas invenções e guerras e civilizações, por não aguentar o peso de sua ínfima existência. Sendo sozinho, não causa minímas cócegas ao Universo.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Des'de tarde, no pôr-do-sol, a concepção iluminada. Que é cheia de vida, beleza, ou quem sabe, qualquer sentimento humano, que desemboque em saudade ou dor: um poema, um romance, ou simples desabafo a dar pontadas na cabeça do escritor.
Toda idéia é inspiração e pertinência. E o escritor já exausto na noite não pode dormir. O peito estala e a idéia na cabeça gira - e até os dedos se preparam para o exercício. É todo ânsia.
Então freneticamente a caneta desliza pelo papel até esgotar o pensamento, ou o sentimento? é um delírio literário, o abstrato em prosa ou verso.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Preocupação

sabe... a minha;
preocupa-me deveras...

terça-feira, 17 de maio de 2011

Poema da Entrega

Entrego-me inteiriça sobre tuas mãos,
como um cordeiro entregue a seus deus
em sacrifício;
porque de mim, nada serei sem ti.

É melhor ser morte e imolação
do que secar incólume,
junto as folhas, no triste outono.

Saberei escorrei meu sangue em seu corpo
para que o ciclo não se quebre, e
com o fim desta vida terrena
possa renascer o nosso amor.

E, enfim, quando chorares minha perda, esganecido,
veja como na morte a vida se completa e surge,
num eterno retorno de águas.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Inconsistente-me.

Ouvir a vida ao som do seu coração, tão certo, tão ritmado, tão livre nas suas prisioneiras batidas.

Quem sabe, poder tocá-los com minhas próprias mãos desencarecidas, sentir o pulsar de sua carne em meio as minhas unhas: coração e vida, para talvez sentir-me mente e lucidez, para talvez recuperar o brio, que ébria de morte, já perdi.

Recuperar meu próprio sangue em tua carne! Remexer as entranhas para supor alma enquanto mortal. Para enfim, supor a vida, alguma vida, qualquer vida... que reste neste miocárdio que tão lentamente insiste em aniquilar-se.

Quero escalar e escaldar a sua pele, descobrir cada filete de carnes, nervos e memórias. Quero reinventar o conceito dos teus orgãos, achar uma nova razão de ser para seus intestinos: alimentar-me jamais; e nova também para teus membros, embebedar-vos de prazer ligeiro e comovente, como a doce primavera da infância que nunca retornará, esquecendo-me, como sensação, inteira. E para teus miolos, ao invés de guardar, que sejam apenas vibrações para a completa distração e lapso.

Queria ouvir-te o que é terreno, sublime e breve, como um corpo que apodrece para o esquecimento.

domingo, 10 de abril de 2011

Sobre cantigas de escárnio e de maldizer de la modernité...

Vivendo nos interstícios é que a mosca do escárnio se acopla, não é nem animal, nem objeto. Nunca esta a posse. É posse. Suga-lhe as diretrizes auriculares da vida. Em sem perceber o sujeito renega-se a própria vida, em causa do maldizer alheio.

- Tira essa película cinza escárnio dos teus olhos. As teias que prendem são lançadas por ti mesmo. Zombaria-se dos outros, pobre lúdico; seu desejo é sua própria maldição. Pútrido!

sábado, 5 de março de 2011

Enquanto vocês dormem

Se vocês soubessem como esta noite está diferente. São três horas da madrugada, estou com uma de minhas insônias. Tomei uma xícara de café, já que não ia dormir mesmo. Botei açucar demais, e o café ficou horrível. Ouço o barulho das ondas do mar se quebrando na praia. Esta noite está diferente porque, enquanto vocês dormem, estou conversando com vocês. Interrompo, vou até o terraço, olho a rua e a nesga da praia e o mar. Está escuro. Tão escuro. Penso em pessoas de quem gosto: estão todas dormindo ou se divertindo. É possível que algumas estejam tomando uísque. Meu café então se transforma em mais adocicado ainda, em mais impossível ainda. E a escuridão se torna tão maior. Estou caindo numa tristeza sem dor. Não é mau. Faz parte. Amanhã provavelmente terei alguma alegria, também sem grandes êxtases, só alegria, e isso também não é mau. É, mas não estou gostando muito deste pacto com a mediocridade de viver.

Clarice Lispector - 18 de maio de 1969

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Transcendendo à Imanência.

O nosso ritual já nos é conhecido, do soar da campainha até o ultimo adeus. Contudo, cada vez que nos encontrados é novo fôlego, nova alma, transcendemo-nos. Lembro-me de cada toque, palavra e respiração, que são os mesmos em cada novo encontro, e tão diferentes toda vez que os sinto. Quando me envolves o mundo separa-se ao meio, como se não fosse mais nada, como se ao nosso redor ecoasse um grande vácuo onde apenas escutamos o nosso som de êxtase. Suas mãos tão firmes e sua boca tão doce e voraz, é a nossa tempestade que dá toque surreal as fantasias de ilha deserta, e o vinho que nos enche de uma paixão maior do que imaginávamos, e aquela água a nos encher de mais energia... mergulhamos em nós mesmos.
Os corpos a se envolverem, a pele a arrepiar, os toques de sadismo, línguas e dentes e salivas e unhas e puxões de cabelos e todos frenéticos a exalar aquele cheiro de nossas peles, aquele cheiro que deixamos incrustado no colchão, nos lençóis, nas roupas e até no olhar... E o suor, os líquidos de nossos corpos e até o sangue. A nossa dança e os movimentos lentos... lentos, até se tornarem rápidos, bruscos... e cada encaixe perfeito, mostrando que somos a imanência da perfeição, da loucura, do desejo e do amor. Somos a divindade. E no fim, pergunto-me então, como?, se somos apenas homem e mulher...

Ps: texto de 2010, reencontrado e editado hoje!!

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Um brinde a união!, de espaços e de vazios... à simples união de corpos, pura conjugação objetiva, toda enlaçada de subjetivismos. Puro ato de amor. Amor à carne, e por que não? Porque não entrar na dança e amar o próprio corpo; a síntese deslumbrante do universo, e um big bang de líquidos.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Da posse inútil e de querer alguém.

Entre o vazio e o inócuo,
no limiar,
o nada e o além;
sempre aonde,
o objeto se encontrará.
De sua essência doce
e caráter inútil,
uma contestação do óbvio:
é meu.

E tornando-se o objeto seu,
na sua inocente posse
existe apenas ausência,
outrossim, ausência de calma.
No limiar, tornar-se-á limiar,
da posse do objeto tornar-se-á objeto,
novamente entre o nada e o além,
pronto para ser contestado.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Uma Negativa a Entidade-Ser!

' Abrace a sua loucura, não perca a direção dela, para não perder a sua direção antes do anoitecer, para vagar entre as várzeas do surreal e irreconhecível tu mesmo! A loucura, para penetrar em tuas paredes de mármore, desmoronar junto a elas. Conhecer os próprios limites... os nossos próprios muros insondáveis e tão dissolúveis. Prova-te, o ferro do teu sangue corrói suas veias, mas você sorri. Nenhuma dor faz sentido. Auto-destruição, auto-restituição. Como já sabido, não se perde nada quando não se tem nada. Os doutos possuem seu conhecimento e tu não precisarás nem de sua carne, pois a insanidade te acometerá eternamente, e eternamente serás o nada.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Auto-descompreensão

Queria ser apenas terra,
porque momentos de compreensão são raros, independentemente de quem aconteça (nós mesmos, irmãos, amigos, amores...); raros como um eclipse, e de momentos tão curtos e longínquos; tão inverossímeis como o olhar sincero de quem só conhece a mentira.
Ser apenas terra,
profícua.
Ninguém pode verdadeiramente compreender ninguém, e a terra, ela não precisa ser compreendida, ela simplesmente existe e ponto. Não precisa de ninguém, nem de si mesma, pois é tudo, e ao mesmo tempo.
Compreender,
que (o) nada precisa de explicação.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Sonhos Realizados

Enfim o desejo do prazer despertava em seu corpo e em sua mente, simples e contido: um sonho. Estava agitada; como pude sonhar com algo que nunca vivi, que nunca senti? Cansada, sentia a ânsia, mas não se der amada, e sim, desejada, porque amor já recebera demais na vida e as vezes é um fardo pesado ser amado, receber tanto amor, sem poder retribuir. Era apenas o desejo de sentir prazer - qual a solução?
Ao final das contas, era uma mulher, de corpo bonito, com rosto sutil; nem bonita e nem feia. Era uma mulher. Tinha o direito de desfrutar de seu próprio corpo, mas não queria ser sozinha, não queria desfrutar sozinha. Queria um homem, alguém que a desejasse e só. Alguém devorando-a com os olhos. Existe alguém assim? se perguntava na própria ingenuidade. Não se pode simplesmente procurar um homem e dizer "eu te quero", as coisas não funcionam assim, não para ela. Para ela tudo sempre foi complexo e triste.
Seu desejo sempre será triste? Sempre no futuro do pretérito, no algo que nunca chegará?
E, um dia, na livraria vazia onde trabalhava, aprofunda-se um homem, talvez 40 anos, misterioso, alto, bonito... mesmo pra idade. Pergunta a ela sobre alguns livros, mas a menina não presta atenção - ele para e sorri:
- Desculpe moça, acho que você estava dormindo. Eu te acordei?
- Não... tudo bem... eu... eu... não deveria ter dormido - disse fingindo. O que deseja?
- Primeiro, preciso me apresentar, Fábio, e você?
- Ah... Sofia, Sônia, Lúcia, tanto faz... aqui ninguém presta muita atenção em mim.
A conversa continuava, tinha seus rumos próprios, falavam sem estarem ali, suaves. Ela perdia-se naquela dança, amar um homem tão mais velho? Era impossível, ele não poderia desejá-la. Deveria ter filhos, ser casado. Isso não! Mas o destino sorriu a ela dizendo " porque não?" é preciso experimentar,é preciso se acontecer.
O homem voltou outras vezes na loja e ao invés de comprar livros ficava conversando com Lúcia. Sem família alguma, todos mortos? E ela nas suas indagações: o que ele fazia ali? será que a desejava, ou amava? Eram tantos os olhares e os dias que se passavam só os aproximava.
Depois de 5 meses, ela ousou, menina de sempre roupas largas e pouco feminina, usou um vestido e até um decote, que belos seios fartos! "... menina, você é incrível, eu te amo e te quero tanto... eu, homem velho."
- Melhor não nos vermos mais, ele disse. Lúcia perdeu sua chance. Estava tão ao seu alcance o que queria e perdeu. Nunca mais o viu.
De súbito e desespero, saiu da loja: demissão. Andou desistindo-se entre as ruas da cidade. Chorou como alguém que perdeu para a morte... 20 anos, inócua, desperdiçada - ninguém mais a viu.
Mas o destino, este sempre nos sorri e diz "porque não?" Fábio rodava a cidade em busca de prazer, triste e sem ninguém, necessitava esquecer aquele amor impossível e fracassado. Pagar por um mulher não pareceu má idéia. Na parte velha da cidade, parou o carro, em frente a uma das moças, parecia a mais bela.
- Lúcia, é você? Perguntou assustado.